Ouguela (Alentejo, Portugal) em baixo; Alburquerque (Badajoz, Espanha) ao fundo.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Mensagem (Maria Bethânia)



Como falamos na sala de aula de escrever cartas, eis uma canção de Maria Bethânia, que declama no meio dela a maior parte de um poema de Álvaro de Campos, heterónimo do poeta português Fernando Pessoa:


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
(...)


Do tempo em que todos escreviam cartas, metiam em envelopes e depois punham no correio. A seguir, estava a espera. Quando é que essa carta vai chegar?!


MENSAGEM

Quando o carteiro chegou
e o meu nome gritou
com uma carta na mão,
ante surpresa tão rude
nem sei como pude chegar ao portão.

Lendo o envelope bonito
no seu sobre-escrito
eu reconheci
a mesma caligrafia
que me disse um dia
estou farto de ti.

Pórem não tive coragem
de abrir a mensagem,
porque, na incerteza,
eu meditava e dizia:
será de alegria
ou será de tristeza.

Quanta verdade tristonha
ou mentira risonha
uma carta nos traz,
e assim pensando, rasguei
tua carta e queimei
para não sofrer mais.


E este é o poema completo de Fernando Pessoa:


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

Álvaro de Campos, 21/10/1935
(Fernando Pessoa)





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