Ouguela (Alentejo, Portugal) em baixo; Alburquerque (Badajoz, Espanha) ao fundo.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Umas palavras de José Saramago



Quero é recuperar, saber, reinventar a criança que eu fui. Pode parecer uma coisa um pouco tonta: um senhor nesta idade estar a pensar na criança que foi. Mas eu acho que o pai da pessoa que eu sou é essa criança que eu fui. Há o pai biológico, e a mãe biológica, mas eu diria que o pai espiritual do homem que sou é a criança que fui.

José Saramago

Diário Público, Lisboa, 14 de Outubro de 1998

In José Saramago nas suas palavras

O escritor português faleceu a 18 de junho do ano 2010.




sexta-feira, 31 de maio de 2013

Mia Couto, Premio Camões 2013

 


Há duas mensagens no blogue, dois post, como dizem muitos utilizando a palavra inglesa, duas mensagens, dizia eu, com textos do escritor moçambicano Mia Couto (A porta e A lição do aprendiz), que acaba de ganhar o mais importante prémio de literatura que existe no mundo da língua portuguesa, o Prémio Camões. É o segundo autor moçambicano que recebe este galardão.

Para o celebrar, temos mais um texto dele, desta vez completo. Um conto intitulado A adivinha. Vão precisar de ajuda com algumas palavras, mas nem é preciso saberem todas para se aproximarem desta história de Mia Couto.



A adivinha

Tudo é um jogo, brincriável. Há o homem, isso é facto. Custa é haver o humano. A vida descostura, o homem passa a linha, a corrigir os panos do tempo. Mimirosa, a menina, nada sabia desses acertos. Acreditava ser tudo simples como o molhado e água, poeira e chão. E assim, tudo em tamanho não aparado: os senhores em infância, as coisas sem consequência.

Seus pais se preocupavam. Passava a idade e Mimirosa demorava a aprender o regime da realidade. Que há deveres, e as contas do ter e do haver. E o ser é apenas o que resta. Noves fora, novos de fora.

Quem estragava esse madurecimento da miúda era sua avó, Ermelinda. A senhora se convertera em parceira de infância, ancorada em irresponsabilidade. Em meia palavra: era companhia de se evitar. Os pais de Mimirosa assim julgavam. A menina devia era evitar os risos, disciplinar arrebatamentos. A escola, em primeiro lugar. A avó, sabia-se, desprezava a escola. Que se aprende mais é fora dela, no calor da família, em redondezas de carinho. Mimirosa estava, por isso, proibida de frequentar a companhia de Ermelinda. Não queriam nem que fosse vista junto, perto do caminho da avó. A menina era conduzida, de mão acompanhada, até às imediações escolares, onde já não poderia desviar a direcção. Imaginava-se. Porque ela, mal se soltava das vistas, se internava no atalhozito que dava na casa da avó. Ali gazetava dos deveres, entretida nos nenhuns afazeres da velha senhora. Conforme os olhos distraídos da velha ela ajudava, rectificando um aqui no além ela. Até que, inevitável, chegava o jogo da adivinhação.

- Qual é um rio que não tem senão uma margem?

- Isso é coisa que não pode, avó! E do outro lado fica o quê?

- Pense, se ensine. Já sabe que o prémio que há-de haver...

Prémio que haveria era só o serem as duas, ali, no escondido. A velha deixava o mistério durar, pairada, parada. A pergunta labirintava na cabeça de Mimirosa. Podia um rio assim? Ou já se viu a estrada correr sem o amparo de duas ambas bermas?

- Mas há o prémio de verdade? - Se você‚ adivinhar esse mistério, o mundo vai ficar tão admirado que até o tempo há-de parar.

- Jure, avozinha?, berlindavam-se os olhos dela.

E voltavam às lides, sem obrigação de nada. O jardim da casa parecia obra de inventar. Uma só arbustozinho nele cabia.

- Vês a sombra? Essa sombra é pequena. Mas existe uma sombra que é da terra toda inteira.

Voltada a casa, a menina era inquirida pelos pais, perguntas sem mistério, coisas de calcular o futuro: quando fores grande já escolheste o que vais ser? Simplesmente, ela não sabia querer ser grande. E, assim, sua ausência na resposta.

- Ela vai ser doutora hospitalar, vaticinava a mãe.

- Ou dessas que faz as contas e faz crescer dinheiro, preferia o pai.

- Tudo serás filha, mas não queremos que sejas como nós.

A menina se admirava: aqueles não gostavam de si mesmos? Por que razão eles queriam que ela lhes fosse diferente? Só a avó gostava de ser como era, cuidadosamente desarrumadinha. Como deviam ser infelizes, aqueles dois, seus pais.

Até que, uma tarde, veio o alvoroço. A velha Ermelinda se sentira mal, o peito dela se amarrotara. Mimirosa, nesses dias, deixou a escola. Mas não a deixaram entrar na velha casinha. A senhora não reconhecia ninguém, ela se convertera em fundo escuro. Nenhuma luz a trazia à superfície de si mesma. E, assim, somaram-se os dias. Mimirosa, obrigada e vigiada, voltou à escola. A sombra do morcego se desenha no tecto? Pois o pensamento da neta não saía do mesmo assunto: saudade de sua avó.

Um dia, enquanto seu olhar fingia percorrer o caderninho, a menina suspulou da carteira e se flechou porta afora. Escapou da escola e correu pelos campos. Ninguém a viu penetrar na penumbra da casa, ninguém suspeitava que se anichara, ofegante, na cabeceira da moribunda avó.

- Avó, sei a adivinha!

No rosto da senhora nenhum sinal, nem uma ruga se alterou. Parecia que Ermelinda já cruzara aquele risco feito na água, fronteira entre a vida e a morte.

- Lembra a adivinha, vó? Aquela do rio de um lado só?

E os olhos da menina se atabalhoaram de água, sentida sozinha no grande mundo. A mão dela ainda arriscou tocar no braço da avó. Mas teve medo. E se chorou! O caderninho órfão, em suas mãos, sofria a catarata das lágrimas. Até que os braços do pai a puxaram. Primeiro ela cedeu. Mas depois esgueirou-se, por um instante, e depositou o caderninho escolar no leito da água. Estava aberto numa figurinha do oceano, mais suas criaturas profundas. E a voz da menina tombada com um derradeiro lenço:

- É o mar, avó. Esse cujo rio; é o mar.

Já se retiravam daquele luto, todos mais Mimirosa quando os dedos da avó tactearam o ar e, cegos, chegaram até no caderno. Depois, acariciaram o azul da imagem. E o caderno começou a pingar, como se o papel não mais contivesse aquela água.

Mia Couto


Mia Couto na Wikipédia


Hoje de manhã saí muito cedo (Pessoa e Pérez Vernetti)

Banda desenha de Laura Pérez Vernetti


Hoje de manhã saí muito cedo

Hoje de manhã saí muito cedo,
Por ter acordado ainda mais cedo
E não ter nada que quisesse fazer...

Não sabia que caminho tomar
Mas o vento soprava forte, varria para um lado,
E segui o caminho para onde o vento me soprava nas costas.

Assim tem sido sempre a minha vida, e
Assim quero que possa ser sempre --
Vou onde o vento me leva e não me
Sinto pensar.

Alberto Caeiro 


Alberto Caeiro é um dos heterónimos do poeta português Fernando Pessoa (1888-1935). 


heterónimo (hetero- + -ónimo) s. m. 1. [Literatura] Nome e personagem inventados por um autor para assinar obras com estilos literários diferentes (ex.: o escritor Fernando Pessoa criou dezenas de heterónimos mas os mais famosos são Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Bernardo Soares e Ricardo Reis).

Não confundam heterónimo com pseudónimo!

pseudónimo (pseudo- + -ónimo) s. m. 1. Nome suposto sob o qual alguns autores publicam os seus escritos.


(Obrigado ao amigo Luís por me ter dado a conhecer esta banda desenhada)


quinta-feira, 30 de maio de 2013

Um rato com personalidade, sim senhor!



Este sim, este é um rato com personalidade, não é um rato qualquer.

Reparem que em português se diz pessoa e pessoal, mas personalidade. Atenção!



Wild Waves (1929)



Dedicado, com muita simpatia, ao Alberto M. (3º A)



terça-feira, 28 de maio de 2013

As calças, as calças, as calças...


Qual "pantalones", qual nada! O que estes rapazes vestem são umas calças, e não "uns pantalones"...  É mesmo assim, juro! :)

De passagem, podemos dizer que as calças deles são de cores, que são bonitas, feias, etc., sempre no feminino plural, visto a palavra calças ter género feminino e número plural.

Vamos esquecer-nos dessa palavra, já sabem, e ficar com as calças na cabeça. Um bocadinho de atenção, meus caros alunos...



segunda-feira, 27 de maio de 2013

Alguém conhece estes moços?


Eis duas ótimas caricaturas de Kleber Sales. Alguém conhece o moço cá em cima? Parece que ele vem para o nosso país. Como é que se chama? De onde é? Quantos anos é que tem? Ah, e em que equipa espanhola é que ele vai jogar?De certeza que alguns de vocês sabem isso tudo, ou quase.




Este moço tem hoje setenta e dois anos. Nos bons tempos dele foi o maior jogador do mundo. Era atacante, ou avançado, como dizem em Portugal. Chama-se Edson Arantes do Nascimento, mas é conhecido universalmente como...




sexta-feira, 24 de maio de 2013

Vício de ti (Mesa)



Os Mesa são uma banda pop portuguesa atual, criada em 2000, com dois álbuns publicados até à data.  Este é o seu sítio: Mesa.


VÍCIO DE TI

amigos como sempre, dúvidas daqui para a frente.
sobre os seus propósitos, é dificil não questionar.
canto do telhado para toda a gente ouvir.
os gatos dos vizinhos gostam de assistir.

enquanto a música não me acalmar,
não vou descer, não vou enfrentar.
o meu vicio de ti não vai passar.
e não percebo porque não esmorece,
ao que parece o meu corpo não se esquece...

não me esqueci,
não me atrevi,
não adormeci,
o meu vicio de ti!

levei-te á cidade, mostrei-te ruas e pontes.
sem receios, atraí-te às minhas fontes.
por inspiração, passámos onde mais ninguém
passou. ali algures, algo entre nós se revelou.

enquanto a música não me acalmar,
não vou descer, não vou enfrentar.
o meu vicio de ti não vai passar.
e não percebo porque não esmorece.
será melhor deixar andar?
será melhor deixar andar?

eu canto a sós para a cidade ouvir
e entre nós há promessas por cumprir.
mas sei que nada vai mudar,
o meu vicio de ti não vai passar.



O Porto, não "Oporto"

Situação do distrito do Porto

Para aqueles alunos que ainda dizem: "Estivemos em Oporto", por exemplo.


O Porto, para além de ser uma cidade, a segunda de Portugal, é um distrito. E o nome desta cidade é mesmo assim, PORTO.

"Oporto" é o nome desta cidade na nossa língua. Leva colado o artigo português que se usa cada vez que se fala dela nessa língua. Em português, o artigo esta aí, nas contrações:


A Joana vive no Porto

Eles chegaram ontem do Porto

Amanhã vou ao Porto


Mas Vivo em LisboaElas chegaram a Lisboa - Hoje vou a Lisboa. Podíamos ter escrito Elvas, Coimbra, Évora, Bragança, Faro, etc. A maioria das cidades não leva o artigo à frente.

Noutro dia falamos de mais algumas com ele como a Guarda ou a Figueira da Foz, mas são poucas.


Não se esqueçam...


 o Porto










quinta-feira, 23 de maio de 2013

Calçada portuguesa no Porto


Uma fotografia a preto e branco.de Paulo Moura. Eu sei que os vossos olhos estão mais habituados à fotografia a cores, mas não é má ideia poderem apreciar fotografias como esta. É outra luz, outra maneira de ver  o mundo.